Dá o play!
Leia o comentário de Carol Ruas ao pé da letra:
Historicamente, Brasil e Argentina sempre alimentaram certa rivalidade, se não no futebol, na economia ou em outras áreas que, por estarmos tão pertos uns dos outros, acabaram entrando na disputa.
Mas a rivalidade se dá também porque ambos os países passaram por momentos parecidos na história econômica, política e cultural. É o caso do cinema.
Assim como o Brasil, nos anos 90 a Argentina passou por grave crise econômica, regada a hiperinflação, desemprego e instabilidade política. Para a indústria cinematográfica portenha, da mesma forma que a brasileira, foi preciso atravessar grandes solavancos para se retomar uma produção estruturada.
Desse contexto surge o chamado Novo Cinema Argentino que, além da superação nacional, há pouco mais de uma década vem se destacando no cenário internacional.
O novo cinema argentino traz a sobriedade e o rigor estético portenhos em uma série de roteiros delicados e diretamente mergulhados nos costumes de uma sociedade marcada pela crise. E isso vem ganhando tanto o público quanto a crítica internacional.
Alguns dos cineastas que representam essa nova geração: Lucrecia Martel, Pablo Trapero, Daniel Burman, Juan José Campanella, Marcelo Piñeyro. São estes também nomes freqüentes no Festival de Cannes, de Veneza, de Berlim, e até mesmo o Oscar. No ano passado, o vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro foi justamente “O segredo de seus olhos”, de Juan José Campanella.
A inevitável comparação com o cinema contemporâneo brasileiro nos faz refletir que a produção argentina evoluiu se recuperando muito mais rápido (ou ao menos em maior escala). No Brasil, o Cinema da Retomada veio desencadear a era Globo Filmes como a mais bem sucedida da nossa cinematografia. Já na Argentina, o crescimento da produção está ligado diretamente aos estímulos do Instituto Nacional de Cinema e Artes Audiovisuais (INCAA) e a multiplicação de escolas de cinema no país.
Na Argentina, foi criada uma lei que cobra taxa sobre a bilheteria dos cinemas, a venda de DVD’s e publicidade da TV – um recurso que vai direto para fomentar a produção nacional. Produção essa, inclusive, que hoje conta com uma rede de salas de exibição estatais, além das leis de incentivos e cotas de tela em salas comerciais. Isso tudo estimulou a produção, que saltou de 24 filmes lançados em 1997, para 69 lançados só em 2004, sendo que mais da metade dos diretores são estreantes recém-saídos da universidade.
Essas decisões políticas acabam refletindo diretamente na estética do produto. Enquanto na Argentina – onde a maioria das produções de destaque é de baixo orçamento – o foco está no cotidiano do indivíduo, o cinema brasileiro (com exceções) tenta compor um painel de sociedade em torno de uma teoria moral: o crime organizado, a polícia, a favela são temas de produções que querem demonstrar um quadro, mas só alcançam um julgamento moral de um ângulo distanciado da questão.
O resultado dessas políticas são filmes e diretores premiados nos principais festivais do mundo. Já no Brasil, mesmo o cinema de mainstream ainda não conseguiu chegar ao gosto da crítica internacional.
Se no futebol, brasileiros acumulam vários títulos a mais que os ‘hermanos’; na produção de cinema a Argentina se revela na vanguarda da estética cinematográfica mundial. É a revanche.
Você não pode deixar de assistir:
O Abraço Partido (2004) – Daniel Burman
Ninho Vazio (2008) – Daniel Burman
O Pântano (2001) – Lucrecia Martel
A Menina Santa (2004) – Lucrecia Martel
O Segredo de seus olhos (2009) - Juan José Campanella
O filho da noiva (2001) - Juan José Campanella
Família Rodante (2004) – Pablo Trapero
Carolina Ruas é jornalista, coordenadora de Comunicação do Fora do Eixo -ES e participante do Grav (Grupo de Estudos Audiovisuais - Ufes).
Fale com ela:
email: carolina.ruasp@gmail.com
twitter: @carolruas
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